Michiko to Hatchin
Estúdio: Manglobe
Diretora: Sayo Yamamoto
Ano: 2008
Nº de episódios: 22
Faz muito tempo que eu queria assistir a esse anime. Os motivos são muitos: ele é razoavelmente elogiado, tem um visual legal, conta com gente de peso na produção e, principalmente, porque se passa em um lugar livremente inspirado no Brasil. É relativamente raro ver animes que não se passam no Japão ou em algum lugar completamente fictício, e os poucos que fogem à regra geralmente adotam a Europa como cenário, então é muito interessante ver nosso país reinterpretado pelos olhos de alguém de uma cultura tão distante e diferente. Claro, o anime não consegue, e nem pretende, fugir muito da visão estereotipada que os gringos têm daqui, mas ao mesmo tempo ele recria o Brasil de uma forma bastante interessante.
Hatchin e Michiko |
O anime é protagonizado por Michiko Malandro, uma morena sensual, desbocada e impulsiva, e Hana "Hatchin" Morenos, uma menina que vivia em um lar adotivo. Após fugir da prisão, Michiko resgata Hatchin de sua família abusiva, e as duas partem em uma road trip em busca de Hiroshi Morenos, pai de Hatchin e antigo amor de Michiko. Com a polícia e antigos desafetos em seu rastro, em meio a perseguições e situações perigosas, as duas conhecem novos lugares, vivem aventuras e criam um forte vínculo.
As protagonistas têm personalidades bastante fortes. Michiko é divertida e descontraída, cai na porrada sem pensar e está sempre brigando com alguém. Hatchin é séria e responsável e muitas vezes parece mais adulta que Michiko, mesmo sendo apenas uma criança. As duas vivem se desentendendo, mas elas se complementam, e à medida que a série avança, a amizade se fortalece. Os personagens secundários deixam um pouco a desejar. Alguns têm momentos que sinalizam que eles poderiam ser bons personagens caso tivessem mais espaço na série, como Atsuko, policial e antiga amiga de Michiko, que protagoniza um ótimo episódio.
Michiko e Atsuko |
O anime segue uma estrutura episódica. Apesar de a procura por Hiroshi ser o objetivo das protagonistas, a série não segue um rumo muito direto, criando tramas fechadas e avançando a passos lentos na direção do objetivo. Isso não é algo ruim, mas aqui deixou um pouco a desejar. Alguns poucos episódios são bons e memoráveis, outros parecem ter se salvado mais pela arte bonita, pela animação dinâmica e pela música marcante do que pela história. Não sei apontar exatamente o que faltou em Michiko to Hatchin para esses episódios funcionarem. Talvez seja o foco na ação desenfreada e a falta de aprofundamento nos personagens e nas relações entre eles? Talvez seja a aleatoriedade da narrativa, que parece avançar e retroceder ao seu bel-prazer, deixando pontas soltas e elementos largados por aí? Não sei, só sei que alguns dos meus animes preferidos são episódicos e eu realmente valorizo quem consegue desenvolver uma ótima história fechada em pouco mais de vinte minutos, mas aqui na maioria das vezes isso não funcionou.
Apesar de narrativamente o anime deixar um pouco a desejar, a parte técnica não decepciona. Cenas bem animadas, character design interessante e diferente, cores vibrantes, belos cenários e ótimas músicas. A trilha sonora merece um comentário à parte: composta pelo brasileiro Kassin e produzida por Shinichiro Watanabe (diretor de Cowboy Bebop e Samurai Champloo), ela é bem representativa da diversidade musical brasileira, com sambas meio tristonhos, melodias bonitas no violão e funks de letras estranhas e ritmo dançante.
Como brasileira, foi muito legal poder reconhecer a língua portuguesa nos nomes de personagens e lugares (tem uma cidade chamada Diarréia!!!), nas placas e nos cartazes nas ruas. Na maioria das vezes, acho que fizeram um bom trabalho, apesar de uma presença maior de nomes espanhóis do que o normal para o Brasil e uns errinhos aqui e ali. Achei maravilhoso pausar enquanto estava assistindo para ler um carta ou algum cartaz que aparecia brevemente. Também é interessante observar as referências a alimentos locais (pastel, cachaça) e os cenários bem brasileiros que conseguiram reproduzir, com favelas, feiras, botecos, igrejas e ruas que realmente poderiam ser brasileiros. A diretora visitou algumas cidades brasileiras antes da criação do anime, e isso é perceptível. De vez em quando aparecem algumas coisas nada brasileiras em cena, como uma tourada, mas aí não sei se é falta de informação ou é simples liberdade criativa.
Como uma recriação do Brasil, o mundo fictício de Michiko to Hatchin até que é bastante semelhante ao Brasil verdadeiro, tanto nos lados positivos quanto nos negativos, com a pobreza, a corrupção, as crianças largadas à própria sorte e o crime. Para um brasileiro, vale a pena assistir só pela curiosidade de ver esse universo. Já como narrativa, Michiko to Hatchin nem sempre foi tão bem sucedido, alternando bons momentos com outros dispensáveis, mas como um todo o anime está longe de ser ruim e acho que fãs de ação poderão gostar mais do que eu gostei.